O ÚLTIMO CORONEL?
O auditor fiscal aposentado, Francisco Germano Filho - Chiquinho Germano - há exatos 50 anos que jamais perdera uma eleição no pequeno município de Rodolfo Fernandes, na região oeste do Rio Grande do Norte, sofreu a sua primeira derrota, nas eleições de 2012. Desde 1962 ele concorrera a onze eleições, vencendo em todas, porém, dessa vez concorreu a vice-prefeito, concorrendo com uma sobrinha que elegeu há quatro anos, perdendo para o candidato da sobrinha, por sinal, irmão do seu candidato a prefeito.
Seria Chiquinho Germano o último dos coronéis a ser banido da vida pública?
A seguir, entrevista que fiz com ele há nove anos, quando explica seu sucesso nas urnas, o pensamento, as estratégias e a convivência com alguns políticos.
LUCIA ROCHA
Especial para
GAZETA DO OESTE
Publicado em 1º de junho de 2003
UM CORONEL DO BEM
Em época de auditorias fiscais, o prefeito de Rodolfo
Fernandes está indignado com tanto desvio de verbas públicas.
Chiquinho Germano: "Ninguém deixa a política. O povo bota para fora" |
O Rio Grande do
Norte assiste a uma onda de devassa por parte do Governo Federal. Guamaré e
Baraúna são cidades que hospedam auditores federais em suas sedes. O que diria
sobre esse fato novo na política do Rio Grande do Norte o último dos coronéis,
Chiquinho Germano?
Prefeito da
cidade de Rodolfo Fernandes, um homem benquisto até pelos adversários. Sendo
ele uma pessoa honesta, que honra seus compromissos com o eleitorado, Chiquinho
Germano apenas diz: “Não sei como é que os políticos desviam verbas. A
fiscalização é rigorosíssima, a ponto de atrasar a entrega de documentação”,
disse surpreso. “Muitas vezes estamos precisando da verba para não parar as
obras sociais e passamos um tempão só cuidando de documentos, pois tudo é muito difícil. Há um
rigor danado e é assim que deve ser quando se trata de dinheiro público”,
completa.
A indignação parte
de um homem simples que atingiu na última eleição 92% de votação. Em 1996 não
houve candidato da oposição para prefeito. Elegeu-se então o primeiro vereador
da oposição em toda história da cidade.
Pode-se dizer que
Chiquinho Germano não pratica o nepotismo, tão comum a políticos. A exceção foi
feita em 1988, com o sobrinho, Silveira Neto, eleito prefeito naquele ano. Sua
competência serviu de passaporte ocupar o cargo
de Secretário de Agricultura.
O menino que nasceu
Francisco Germano da Silveira Filho, carinhosamente chamado de Chiquinho
Germano, ou seu Chiquinho, é filho de
Francisco Germano da Silveira e Jacinta Queiroz da Silveira. Nasceu em Luís Gomes , Alto Oeste,
em 16 de abril de 1930. Há setenta e três anos, portanto.
Aos nove meses
foi para a companhia dos tios, o Juiz de Direito, dr. José Fernandes Vieira e
Amélia de Queiroz, na cidade de Pau dos Ferros, tendo ali se alfabetizado.
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HERDOU DO PAI O GOSTO PELA POLÍTICA
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HERDOU DO PAI O GOSTO PELA POLÍTICA
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Aos dez anos de
idade o pai adotivo assumiu a Comarca de Mossoró,
tendo aqui concluído o curso ginasial, no Colégio Diocesano Santa
Luzia. Ingressou na política estudantil, participando da fundação do Centro
Estudantil Mossoroense. Organizou movimentos, campanhas estudantis e ingressou
no mercado de trabalho. Iniciou o curso técnico em contabilidade, na Escola
Técnica do Comércio União Caixeiral, não chegando a concluir.
Seu primeiro
emprego foi na Mossoró Comercial e Navegação, ao lado de pessoas de inteira
confiança do então industrial, Dix-Sept Rosado.
Aos vinte anos
de idade estreou no palanque, na campanha de Dix-sept Rosado para Governador do
Estado. O gosto pela política herdara do pai, porém um tio, Antonio Germano, foi senador e
deputado estadual.
O destino
reservava a política mais para frente.
Luiz Gomes, Pau dos Ferros e Mossoró, foram
cidades que o acolheram, mas seu Chiquinho não estava satisfeito. Queria ir
mais longe. O próximo destino seria Natal, Rio de Janeiro. Depois Aracaju e
Recife. Fixou residência em Natal, onde atuou no Ministério da Saúde.
Atendendo convite do Governador Dinarte Mariz, foi nomeado Fiscal de Rendas. Em 1961 se viu atingido por perseguições políticas. Resolveu pedir licença, sem remuneração e, de volta para o interior, assumiu a administração das fazendas da família, aos trinta anos de idade.
Atendendo convite do Governador Dinarte Mariz, foi nomeado Fiscal de Rendas. Em 1961 se viu atingido por perseguições políticas. Resolveu pedir licença, sem remuneração e, de volta para o interior, assumiu a administração das fazendas da família, aos trinta anos de idade.
Na Vila
de São José, que havia sido desmembrada da cidade de Portalegre, Chiquinho com
seu jeitinho manso, um homem polido, educado, foi acumulando amigos e
correligionários. A vila se emancipou. Nascia a cidade de Rodolfo Fernandes. Era
1963 e agora precisava de um prefeito.
Pronto!
Chiquinho, um jovem benquisto, com habilidade em lidar com gente, de todas as
camadas sociais, mostrou ser um líder nato, do tipo que sabe onde está pisando.
Foi lembrado pela população. Surpreso aceitou o desafio. Indo à luta, venceu.
Tinha 33 anos de idade.
O PREFEITO QUE JAMAIS CONHECEU A DERROTA
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Lá se vão
quarenta anos e o homem está aí. Tratando todos por igual. Voz baixa. Às vezes inaudível. De vez em quando
arrasta a sandália, do tipo franciscana, num forrozinho. Principalmente nas
vaquejadas. Faz par com todo mundo. Uma sobrinha. A filha de um amigo. Ou com
alguma eleitora. Gente afoita também. “Tendo forró e eu indo, danço com todo
mundo”, se anima.
Continua, não
apenas o líder maior do município, mas um coronel. Um coronel sem chicote. O
último dos coronéis, talvez.
Dessa estirpe, com
certeza, o único em
vida. Espécie rara.
Um dia o Diário de
Natal registrou como manchete: “O PREFEITO QUE JAMAIS CONHECEU A DERROTA”. O
homem conquistou a mídia.
É verdade. Chiquinho só conhece vitórias
em sua vida. Um prefeito que nunca precisou ir na Capital Federal pedir nada. “Nunca
pus os pés em Brasília.
Os deputados pegam os projetos e têm a obrigação de trazer os
benefícios para os municípios. Para isso é que existe deputados e senadores”,
desabafa.
Ele prefere ficar
lá. Em Rodolfo Fernandes ,
ocupado com outras tarefas. Não se afasta do povo. Nem mesmo no final de semana,
quando recebe todos em casa, de portas
escancaradas. Cada um chega, vai na cozinha e serve o seu cafezinho.
Casado há trinta
e quatro anos com Simone Queiroz Negreiros Germano, professora aposentada, grande
companheira da luta. Também prima.
Trabalha nos bastidores. Formada em Letras, só trata o marido de ‘Seu
Chico’. O casal tem dois filhos, o advogado José Negreiros Neto, que atua em
Natal e zona salineira; e o empresário Cristiano de Queiroz Negreiros Germano,
que atua no ramo de material de construção, em Mossoró.
Quando vai a Rodolfo Fernandes,
Simone se hospeda na Fazenda São Gabriel, embora o casal mantenha uma casa no
centro. Como primeira dama sente o peso da responsabilidade. “Me interesso
bastante pelo progresso da cidade”, comenta sem modéstia e já fazendo questão
de dizer que seu modelo de primeira-dama é o de dona Adalgiza, viúva do
governador Dix-sept Rosado. “Uma pessoa desprovida de qualquer vaidade e
egocentrismo”, disse se auto-denominando também.
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“DISSE A VINGT QUE NUNCA MAIS VOTARIA NELE”
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“DISSE A VINGT QUE NUNCA MAIS VOTARIA NELE”
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Durante muitos
anos Chiquinho seguiu o líder político, Vingt Rosado, já falecido. “Um dia lhe
disse que nunca mais votaria nele. Ele pensou que era brincadeira”, recorda. Há
anos segue o grupo político do senador José Agripino.
Chiquinho
Germano é um homem bastante respeitado e prestigiado pelos políticos. Até mesmo
dos adversários. Uma prova desse prestígio são os cartões enviados para a
esposa, Simone, Não esquecem nem o seu aniversário. “O primeiro sempre vem da
parte de Geraldo Melo, seguido pelo de Henrique Alves”, registra. Só então vem
dos aliados do PFL, como Ney Lopes, José Agripino e Anitinha, por exemplo.
O ex-deputado
Laíre Rosado, do PMDB, lembra que logo que retornou a Mossoró e começou a trabalhar como médico,
precisou fazer um empréstimo no Banco do Brasil, encontrando obstáculos.
Comentou numa roda de amigos. Foi surpreendido por um dos presentes. “Na mesma
hora Chiquinho se prontificou e o empréstimo foi possível. Eu não o conhecia,
mas ele sabia de mim”, conta Laíre.
Tivesse
permanecido na região Sudeste, Chiquinho Germano teria sido um empresário bem
sucedido à exemplo de seus irmãos, empresários do ramo de alumínio, José e
Wellington Germano, donos da Bel Metal, radicados no Rio de Janeiro e São
Paulo, respectivamente. Em
Belo Horizonte tem o comerciante, Aldecir Germano. Em Mossoró
o também empresário, Damião Queiroz, já falecido, dono da Queiroz & Filhos.
Da prole tem as donas de casa Elita, em Mossoró, e Erci, em Natal. Além dos
agropecuaristas, Antonio e João Germano, residentes em Mossoró e Rodolfo
Fernandes, respectivamente.
A família se
reúne na festa junina de Rodolfo Fernandes. Aliás, é um compromisso que
Chiquinho tem com a cidade. Todo ano leva o amigo Redondo, que se apresenta com
a irmã, Rita de Cássia e banda. “Enquanto
a gente estiver vivo tem forró para todo
mundo”, garante.
Também durante
as festas juninas os munícipes – são pouco mais de quatro mil habitantes -
homenageiam o prefeito na Praça do Povo com um bolo gigante, onde cada metro corresponde
a um ano de Chiquinho na vida pública. O bolo desse ano terá quarenta e três
metros e estará à disposição para degustação da população no corredor junino,
organizado pelos familiares e eleitores.
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“NINGUÉM DEIXA A POLÍTICA. O POVO BOTA FORA”
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“NINGUÉM DEIXA A POLÍTICA. O POVO BOTA FORA”
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O mesmo
compromisso tem com saúde e educação. Com o bem estar dos idosos, a dentição e
a taxa de diabetes da população, colocando médicos e dentistas a serviço dos
moradores. Se emociona ao citar o projeto que implantou para a terceira idade,
disponibilizando médicos, distribuição de sopas e também lazer. “Tem forró toda
quarta-feira num salão para idosos. Uma banda local anima e é servido lanche.
Nos outros dias tem caminhada”, detalha.
A cidade dispõe
de médicos da família e de agentes de saúde. Dois dentistas prestam serviço
completo, até mesmo com confecção gratuita de dentadura durante todo o ano. As
crianças dispõem de uma pediatra.
Chiquinho
Germano é o único que conseguiu se eleger quatro vezes prefeito de uma cidade
no Rio Grande do Norte.
Qual a fórmula
de sucesso desse coronel? “Isso não tem receita, não!”, enfatiza. Com
insistência solta algumas dicas: “Em primeiro lugar, acho importante o sábado e o domingo. O homem do campo não
tem o que fazer e vem na cidade. E 90% dos prefeitos somem nos finais de
semana”, explica. Ele conta que na ausência do prefeito, tem que haver alguém
com capacidade para resolver os problemas, principalmente na área de saúde. “É
a parte mais vulnerável da política. Se você cuida da saúde e da educação, as
outras coisas dão certo”, argumenta.
Outra receita
de sucesso é um livro, onde anota o nome de cada um de seus eleitores, com
endereço e até apelidos. “Converso pessoalmente, pelo menos, com dois mil
eleitores e coloco uma cruzinha ao lado de quem vota”, conta lembrando que na
próxima eleição começa tudo de novo. “Cada caso é um caso. Toda eleição é
diferente. Os problemas são diferentes. Por isso dizem que a política é
dinâmica”, analisa.
Seu Chiquinho
sabe, através de pesquisas pessoais, que tem maioria entre os adolescentes e
idosos.
Questionado
sobre quando vai deixar a política, ironiza: “Ninguém deixa a política, minha
filha! A política é que deixa a pessoa.
O povo bota para fora”, brinca ele que não gosta do rótulo de coronel. ”Não
tenho entusiasmo como coronel. Não me sinto coronel”, desconversa.
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